sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Sempre Aprendendo, Sempre Ensinando - 1

Segue alguns pensamentos e trechos do discurso do professor David M. Whitchurch, que é professor de escrituras antigas da BYU.

Tratar os Outros com Respeito

Outro componente do ensino eficiente é a capacidade de respeitar aqueles a quem se ensina. Um professor precisa reconhecer que muitas vezes se aprende tanto dos alunos quanto se ensina a eles, isto é, o ensino é uma rua de duas mãos. Um professor eficaz mostra respeito para os alunos ao escutar e interagir com eles. Parker Palmer, num ensaio chamado “The Heart of a Teacher: Identity and Integrity in Teaching” [“O coração do professor: Indentidade e integridade no ensino”], declarou:
O ensino, como toda atividade verdadeiramente humana, para o bem ou para o mal, surge do âmago. Ao ensinar, eu projeto a condição da minha alma nos alunos, na matéria e em nosso convívio. As confusões que presencio na sala de aula muitas vezes não são mais nem menos do que a inquietação da minha vida interior. Quando se enxerga desta perspectiva, o ensino na verdade é um espelho da alma. Se eu estiver disposto a olhar no espelho e não fugir daquilo que vejo, terei a oportunidade de adquirir auto-conhecimento. Conhecer-se a si mesmo é tão importante para o bom ensino como conhecer os alunos e a matéria. [27]
O Salvador mostrou este princípio ao viajar pela região de Tiro e Sidom (vide Marcos 7:24–30). Enquanto ele estava lá, uma mulher não israelita lhe rogou que curasse a filha dela que tinha um espírito imundo. Jesus lhe respondeu, dizendo: “Deixa primeiro saciar os filhos; porque não convém tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos” (7:27). Em outras palavras, ele lhe disse que sua missão não era para os gentios e que não curaria sua filha. Não satisfeita, a mulher lembrou o Salvador de que até os bichos de estimação da casa recebem pão da mesa do dono. Depois de ouvi-la, Jesus curou sua filha. Para que o ensino seja sincero, os alunos precisam saber que o professor, como o Salvador, escuta e responde conforme aquilo que ouve. Joseph F. Smith mostrou na seguinte carta sua disposição de escutar Martha Ann:

Ilhas Sanduíche

14 de junho de 1857. . .
Querida irmã, uma oração curta de tua carta me atingiu como as poderosas ondas de uma tempestade de oceano! O que foi?— “Sinto que sou uma pessoa fraca e doentia e não sei por que Deus não te abençoa, que és muito mais digno que eu, da forma que me abençoou?”—Martha, não me tentes. Aquela linguagem, embora simples, fala mais alto que os raios do céu que tu me amas e que desejas levar uma vida de humildade e oração. Oh! humildade! Quão belas são as suas influências que profunda sua serenidade e alegria! Este assunto me domina e me derrete!—Martha, o que tu disseste me admoestou. Aceito a correção com gratidão embora fosse indireta, pois quando a li algo me pareceu sussurrar à mente: “Joseph, compreendes o que lês”? “Que entenda quem lê.” Estes pensamentos de admoestação me vieram à mente: “Acorda-te e aceita mais plenamente teu dever!” Agora posso refletir e ver que eu poderia ter indireitado mais meu caminho e ter sido mais diligente ao desempenhar o meu dever, mas estes pensamentos logo se afastam mediante o provérbio voraz: “o tempo que passou nunca mais voltará, o momento se perde, está perdido para sempre!” Portanto, por que chorar pelas coisas que não podemos alterar, ou, nas palavras da querida prima [p. 2] Josephine, por que “lamentar os prazeres já desbotados e as alegrias que o tempo nunca mais restaurará?” Não tem jeito, estou totalmente determinado a enfrentar as coisas que vierem com a marcha imutável do tempo. Desejo dizer: Adeus tempo fugaz, tempo trabalhador que não espera o preguiçoso. O homem não pode mandar parar o andamento do tempo, mas pode fazer seu dever em acelerar a chegada da hora em que toda a criação chegará ao destino para o qual foi criada.
A leve admoestação de Martha Ann se tornou uma oportunidade para  Joseph F. examinar sua alma e fazer correções em sua própria vida. O Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa define respeitar  da seguinte forma: “tratar com reverência ou acatamento; venerar, honrar.” [28] Um professor efetivo mostra respeito pelos alunos por meio de escutar e efetuar certas modificações tanto no ensino como na vida particular. Se professor não tem respeito pelos alunos pode ser assim por um dos seguintes motivos:
Primeiro, o professor pode erroneamente acreditar que escutar os comentários dos alunos o fará vulnerável a mais críticas ou que enfraquecerá o controle da classe.
Segundo, o professor pode estar com medo de revelar suas fraquezas pessoais aos alunos, pois isso pode provar que os professores fazem erros também e não têm todas as respostas a todas as perguntas. Na realidade, porém, as desvantagens de tal mentalidade excedem os benefícios. Os alunos que veem a humanidade do professor são mais capazes de reciprocar ao atender às exigências e expectativas do professor. Parker Palmer nos dá mais entendimento sobre os professores que abrem o coração para os alunos:
Quando o bom professor tece o pano que o une aos alunos e matérias, o coração se torna o tear onde se amarram os fios, se mantém a tensão, a lançadeira voa e o tecido se faz. Não é de se admirar, então, que o ensino gere emoções, abra o coração e até quebre o coração, de fato, quanto mais se ama ensinar mais dolorosa se torna, às vezes.
Tornamo-nos professores por motivos do coração, animados pela paixão por certa matéria e pelo desejo de ajudar as pessoas a aprenderem. . . . A coragem de ensinar é a coragem de manter aberto seu coração justamente naqueles momentos quando se pede mais ao coração do que ele pode aguentar e desta forma o professor, os alunos e a matéria são tecidos, formando o pano exigido pelo aprender e viver. [29]
Num intercâmbio de cartas sobre o casamento vemos outra carta que mostra o respeito que Joseph F. tinha pela irmã. No dia 3 de maio de 1857, Martha Ann escreveu uma carta a seu irmão, avisando-o que ela havia se casado. Faltavam duas semanas para ela completar dezesseis anos e ela mostrou-se preocupada em como Joseph F. reagiria:
Querido irmão, há uma notícia que eu quero participar, mas minha mão treme ao escrevê-la porque escrevo de consciência culpada perante meu irmão, pois temo que ele sinta que eu o tenha desprezado. Perdoa-me meu querido irmão. Receio que esta notícia possa diminuir seu afeto, mas não posso escondê-la mais, preciso dizer-te que sou casada—com William Harris. Acho que vais te sentir chocado ao ouvi-la; eu quase fico chocada também ao pensar nisso, mas é verdade. Agora devo dizer-te o por quê de tudo isso e assim espero que não me culpes muito. Ele tem passado muito tempo comigo. John lhe deu licença de entrar no namoro e eu não me opunha. Comecei a gostar muito dele e ele de mim. Para dizer a verdade tenho gostado dele já por algum tempo, dois anos no mínimo, e não consegui focalizar nos estudos, como podes ver (referindo-se a sua ortografia imperfeita). Meu coração estava jovem e terna e meu afeto se tornou óbvio. John percebeu, mas eu não falei nada para ninguém, nem para ti, meu amigo mais íntimo e querido. Tentei esconder tudo isso, mas apesar disso John soube, pois ele pôde ver que eu não aprendia muito e ele precisava saber por quê e acabei contando para ele. John falou com o Irmão Kimball a respeito disso e este disse que achava que devíamos nos casar antes de William fazer missão e John concordou que seria melhor assim e que meu espírito se acalmaria para eu poder voltar aos estudos e aprender alguma coisa, senão eu não poderia estudar. William foi receber suas bênçãos [do templo], porém eu ainda não sabia com certeza se devia me casar antes dele partir. O Irmão Kimball o mandou buscar-me, dizendo-lhe que seria melhor completar tudo naquele dia, de forma que ele veio e fui com ele e fomos selados perante o altar. Ele logo partiu para a Inglaterra para fazer missão, puxando uma carrocinha de mão pela grande planície. Casamo-nos numa terça-feira e ele saiu na quinta, de modo que podes ver que não passei muito tempo com ele e me contento com isso, pois se ele não fosse embora, eu nem teria dinheiro suficiente para mandar esta carta e tu ficarias sem saber do meu casamento até voltar da missão. Há muito tempo que tenho saudades de ti e anseio por sua volta. Ao voltares, quero que encontres a mesma pessoa que eu era quando saíste, mas as coisas nem sempre são como o coração humano deseja. Não obstante sou a mesma pessoa, só que agora sou casada, mas estarei livre [do papel de dona de casa] por mais três anos. Meu querido irmão, eu te rogo que me trates como sempre me tratava, pois, senão meu coração quase que será partido. Dá-me conselhos e me esforçarei em segui-los. Não sou perfeita, mas ainda (e sempre) te agradecerei os conselhos e eu não me ofenderei. Se eu me ofendesse, acho que seria muito tola e precisaria de admoestação, pois sou muito grata ao pai por ter me dado um irmão que se importa com o meu bem-estar, porque sei que tu te importas mais com meu bem-estar do que qualquer outra pessoa nesta terra. Ó Joseph, queira Deus que eu pudesse expressar os sentimentos tais como são. Sou grata por tua bondade para comigo. Nunca poderei esquecer-me de ti, nem por uma hora. Nunca te esqueci desde sua partida para bem longe de casa. Tenho pensado em ti em todos os lugares em que eu estivesse, não importando onde.
No dia 14 de junho de 1857, Joseph F. escreveu uma carta a Martha Ann antes de receber a carta citada em cima. É interessante que  Joseph F., sem saber que Martha Ann havia se casado com William Harris, escreveu justamente sobre o assunto do casamento. O breve extrato que se segue nos transmite o espírito da carta:
. . . Estou selado a alguém? Não, não estou. Alguém se casou comigo para a vida por um voto sagrado? Não, não há ninguém. E por quê?—Vou te revelar o segredo. Não tenho a vida garantida, a não ser mediante minha própria bondade e meu próprio mérito. Aí sim, Deus assegurará minha vida para que eu possa desfrutar de muitas bênçãos, portanto se Deus me poupar a vida para uni-la à vida de uma mulher em que haja a intensa luz do fulgor celeste que ilumina e arde na hora do negror da adversidade e a qual esteja disposta a compartilhar o humilde destino de um que ama um coração honesto e humilde, daí direi: Para Deus a glória, porque qual é a hora que é minha? Que momento pertence somente a mim? Em que hora Deus dirá: Joseph, exijo tua alma na minha presença—? Posso dizer que não? Não posso. Então agradeço ao Senhor que nenhuma alma ainda foi selada a mim. Não, pois sou livre como o ar e assim todas  estão livres de mim. Não quero me amarrar a ninguém [isto ainda em época de missão] até poder sustentá-la e cuidar dela. Até lá, escutem, lindas senhoritas, estão livres de mim. Onde não houver nenhuma promessa não se quebrará o coração. Agora o propósito de eu dizer tudo isso é que não quero que tu faças nenhum juramento com ninguém se puderes evitá-lo. . . .
Como será que Joseph F. reagiu ao ouvir a notícia de Martha Ann, dado que ele não queria que ainda se casasse? A carta que ele lhe escreveu mostra sua capacidade de respeitar a decisão de Martha Ann. A seguinte carta foi escrita em 25 de julho de 1857:
Querida irmã Martha Ann:—Recebi tua carta comprida do dia 3 de maio, faz mais ou menos uma semana, e fiquei muito contente em ouvir notícias tuas. Fiquei surpreso ao receber a notícia de teu casamento, mas já que não pude estar aí para participar da festa, só posso te desejar muita alegria e uma vida feliz. Tu acabas de dar o passo mais importante de sua vida, ou existência, sob os laços do evangelho. Por um lado, todos os prazeres sociais, a felicidade de sua existência atual e as bênçãos de um lar alegre e feliz, bem como uma posteridade obediente  que ama Deus dependem do passo que acabas de dar, mas, por outro lado, quem não der o passo de forma certa herderá as misérias e as tristes cenas de descontentamento, discórida e amarga infelicidade. Fico trêmulo até o íntimo ao pensar neste assunto tão fascinante, ao olhar ao meu redor e refletir nas terríveis circunstâncias que ocorrem todos os dias entre os grandes e letrados, os pequenos e iletrados bem como os ricos e os pobres. Reflito nas esposas aflitas, nos maridos destraídos, na inveja em todas as sua formas horríveis, no rancor venenoso da desconfiança com sua faca da vingança desenbainhada para verter o sangue de mulheres, maridos e filhos! Recuo com horror desta cena. Parece-me extremamente curioso como as pessoas entram a todo vapor num negócio que tanto afetará sua prosperidade e felicidade futuras e, por outro lado, pode trazer-lhes pesados sofrimentos e um rio de problemas dos quais é possível que nunca consigam se livrar, —porém—com todas estas considerçãoes em frente de nós, não é para nós [da Igreja] como é para o resto do mundo. Nós temos a luz do evangelho, a influência do Espírito Santo, os ensinamentos dos profetas e servos de Deus para nos conduzir a todas as verdades e ensinar-nos nosso dever. Se tu seguistes os conselhos [do servo de Deus], está tudo bem e serás vitoriosa. Tu agora certamente deixarás as meninices. Espero que te lembres de teu estado de privilégio e deixes que suas ações e comportatmento em todas as coisas se tornem um acervo de respeito, estima e amizadade para ti no coração de todas as pessoas boas e honestas. Agora queres que eu te diga como se alcança este resultado desejável?—Só pela oração—com fé e esperança em Jesus Cristo e seu evangelho. Quem possui seu lugar no verdadeiro reino de Deus, nunca precisará ter medo.
Ao invés de criticar ou condenar Martha Ann por ter se casado, Joseph F. mostra sua maturidade por meio de desejar-lhe alegria e felicidade seguido de conselhos amáveis e gentis. Seu respeito pela irmã se tornará ainda mais notável se levarmos em conta que ele só tinha dezoito anos na época que escreveu esta carta. Um professor eficaz reconhece em que fase da vida estão os alunos e, em vez de julgá-los com dureza pelas decisões que fizeram, transforma as circunstâncias da vida em oportunidades de ensinar princípios corretos. O entendimento da doutrina por parte de Joseph F. Smith, como vemos na parte final da carta, mostra quanto conhecimento do evangelho ele havia adquirido, mesmo sendo muito jovem. Ao longo de sua vida ele usou este conhecimento para beneficiar os outros.
[27] Parker J. Palmer, “The Heart of a Teacher: Identity and Integrity in Teaching,” Change 29, no. 6 (November/December 1997): 15.
[28] Dicionario Aurélio da Língua Portuguesa, 3ª edição, “respeito” (Editora Positivo: 2004).
[29] Palmer, “The Heart of a Teacher: Identity and Integrity in Teaching,” 18.

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